Scortecci Editora - Contos - Formato 14 x 21 cm - 1ª edição - 2024 - 68 páginas
(In)diferençaPaulo Viana
Após nos guiar pelas vielas e becos de uma comunidade miserável dominada por traficantes, no sensível Misérias anônimas, e esmiuçar a maldade humana e a loucura, no contun-dente Soberba, Paulo Viana nos traz agora dez histórias curtas e impactantes. Diferentes temas permeiam os dez contos deste livro. O que os uni-fica são as referências a uma sociedade em que os membros têm em comum a prática de atos de corrupção, maldade, descaso e falta de amor. A maldade inerente à espécie humana é vista na dona de escravos no conto “No Cais do Valongo”, no bando de gaviões que sequestram outras aves e as fazem escravas no emblemático “Os pintassilgos e a senhora Woolf”, nos torturadores da ditadura militar em “Pretinha” e na sociedade apática e violenta que abandona as pessoas à própria sorte no doloroso “(in)diferença”. “Após a utilidade...” e “(im)paciência” tratam da velhice e da solidão, do descaso da sociedade e da família para com os idosos. Ambos os contos se fecham na constatação de que “deve-se temer a velhice, porque ela nunca vem só” (Platão). Um tema que ecoa em nossa mente durante muito tempo após a leitura, deixando-nos com um gosto amargo na boca.No divertido “Carolina”, somos apresentados a uma solteirona devota, virgem e reprimida, que decide dar asas a sua imaginação devassa. Nem mesmo o vendedor cego escapa de seus desvarios, quando ela resolve personificar Chapeuzinho Vermelho em meio a uma floresta de tecidos. Os personagens Maria Cristina, Josephine e Clarisse parecem humanos à primeira vista, com seus dilemas e tragédias. Mas são uma vaca, uma anta e uma mosca respectivamente. Maria Cristina é a personificação de uma diva da era de ouro hollywoodiana: enganada, traída e vilipendiada, ela ja-mais perde a classe. Josephine parece ter saído de um melodrama classe B, e sua trajetória vai de escrava a traficante, com reviravoltas dignas de uma montanha-russa. A trajetória da mos-quinha Clarisse é uma crítica ácida ao consumo desenfreado e à vida louca como se não houvesse amanhã.